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Dia Internacional dos Direitos Humanos: membro da Pastoral Carcerária rejeita condecoração no MA



Por Pe. Claudio Bombieri, MCCJ*


Hoje, 10 de dezembro, comemora-se o Dia Internacional dos Direitos Humanos. O período coincide com a ‘Semana dos Direitos Humanos’, seja em nível estadual e/ou federal, bem como na esfera governamental ou na própria sociedade civil. Há formas bem diversificadas de ‘celebrar’ esse momento. Tudo depende, porém, do lugar social em que queremos nos situar e olhar esse acontecimento.


Há governos estaduais e, inegavelmente, o atual governo federal, que acham que vêm ‘concedendo’ aos seus cidadãos direitos e garantias em excesso. Vivem permanentemente às turras com movimentos sociais e outras organizações que, supostamente, não lhe reconhecem o seu esforço institucional em ampliar o conjunto de direitos difusos. Para nós, da sociedade civil, que conhecemos o que significa ser humilhado por policiais, ser excluído de atendimentos médicos condizentes, sofrer preconceitos e violências de toda ordem sem haver nenhum tipo de punição, que vemos a educação sendo sucateada etc, a semana dos D.H. é oportunidade para dizer que o nosso projeto social não combina com o dos palácios! Que não nos deixamos anestesiar pelo ‘canto das sereias’!


É nesse contexto que se torna emblemática a recusa do padre Marco Passerini, membro da Pastoral Carcerária do Ceará, a receber a ‘Comenda Magno Cruz’, oferecida pela Secretaria dos Direitos Humanos do Maranhão. Passerini se destacou, naquele Estado, na defesa dos DH de 1973 a 1988. Ao reler agora a sua carta de recusa (leia ao final), pergunto-me se alguma vez houve um reconhecimento público formal, uma espécie de premiação, por parte do conjunto da sociedade civil a um governador, a um ministro, a um secretário de Estado, ou a um presidente da República por terem fomentado políticas públicas corajosas de defesa e de promoção dos direitos humanos. Um clamor social aplaudindo ações institucionais, de governo, de ampla envergadura, capazes de ‘fazer a diferença’ no cotidiano de pessoas desrespeitadas em suas dignidades.


Até agora estou sem resposta e, certamente, haverá muitos que acham um tanto estapafúrdia tal possibilidade. Não é para menos. Após mais de 70 anos da Declaração (pouco) Universal dos Direitos Humanos, assinada por vários chefes de estado, tem-se a impressão que, hoje, até as vítimas da violência institucional, do desemprego sistêmico, da fome e da desnutrição, das epidemias e pandemias, das perseguições por causa de raça, gênero, religião etc, estão deixando de acreditar que seria ainda possível uma guinada radical. Uma espécie de reviravolta em que a Justiça, na sua acepção mais ampla, venha a se tornar uma ‘política de estado’, e não um apêndice.


Paradoxalmente, constatamos que é justamente o Estado, e seus onipresentes tentáculos, quem mais nega e atropela o que afirma defender. Ao longo desses anos assistimos, inclusive, ao pior: a apropriação também simbólica, por parte do Estado, daquele ideário libertário e emancipatório que sempre existiu nas entranhas dos seres humanos e em suas lutas históricas. De um lado temos o carrasco e hipócrita estado que vende a imagem de defensor universal de todos os direitos para todos os seus cidadãos - inclusive criando secretarias, varas especiais e ministérios específicos - e do outro, assistimos às espúrias e sórdidas alianças com seus comparsas empresários, traficantes, banqueiros cúmplices em atacar, prender, violentar, manipular os desprotegidos cidadãos.


No atacado o Estado, seja ele estadual ou federal, vende a imagem de grande protetor imparcial e promotor de direitos e, no varejo, em plena luz do dia, agride tudo e todos, quando alguém resiste às suas insaciáveis ambições e múltiplos interesses.

Hoje, defender e propor novos direitos humanos é perigoso. E faz derramar sangue! A umbilical cumplicidade entre o estado e as grandes empresas nos jogaram no vórtice do medo psicológico e social. O medo de perder o emprego, de passar fome, de ser preso, de ser linchado, de ser humilhado, de virar um proscrito social por defender um modo específico e digno de ser e de existir, faz com que, muitas vezes, se aceite todo tipo do abuso e arbitrariedade. Ao passo que outros, impávidos e arrogantes, têm esperança de sobra. Esperam continuar a torcer corpos, estuprar ecossistemas e manipular consciências, sem medo de serem punidos. Afinal, a mão que bate em Chico não bate em João!


A justificativa legal utilizada por desembargadores, juízes e ministros de tribunais para prender e condenar ‘pobres, pretos e putas’ não serve para prender e condenar os magnatas do agronegócio, da construção civil e outros que invadem territórios indígenas e de preservação ambiental, torturando, escravizando e massacrando quem os contestam.

Contudo, é graças a tudo isso que temos que cultivar, hoje - muito mais que em outras épocas -, a esperança de que ainda temos espaço e condições para interromper o vórtice do medo institucionalizado, desnudando e denunciando a hipocrisia do Estado. E jamais aceitar qualquer tipo de pacto com os carrascos de colarinho branco! Quando uma secretaria de Estado premia solenemente cidadãos defensores e recriadores de direitos é porque, talvez, queira camuflar, solene e publicamente, a verdadeira face de algoz da máquina estatal de que faz parte, perpetuando a enganação social e política.


E quando um cidadão, em nome da sua coerência pessoal e política, recusa um reconhecimento outorgado por quem desrespeita direitos primários, é um claro sinal de que ainda há esperança nessa terra. Um sinal de que muitos cidadãos, defensores intransigentes de vida plena, não morreram em vão! E que os vivos e resistentes de hoje podem e devem se fortalecer e se motivar a partir das ruínas das esperanças do passado, reconstruindo e construindo algo que jamais se viu ou se imaginou!


*Missionário comboniano, teólogo e antropólogo. Confira mais textos em: padrebombieri.blogspot.com


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CARTA DE RECUSA

Prezadas (os).


Há poucos dias manifestei minha surpresa e gratidão pela outorga do Prêmio Magno Cruz de Direitos Humanos 2021 à minha pessoa. Esse reconhecimento seria uma oportunidade para me reconectar com as lutas de ontem e de hoje, de cidadãos e cidadãs, grupos, movimentos e etnias do Maranhão que continuam persistindo na construção de uma sociedade justa, sustentável e pacífica.


Não seria um reconhecimento pessoal, mas um memorial de tantos companheiros e companheiras de caminhada. Pessoas que têm nome e sobrenome, algumas ainda vivas resistentes e resilientes, outras que nos deixaram fisicamente e outras, enfim, que acabaram fazendo escolhas duvidosas. Como no passado, ainda hoje, a minha história é escrita no plural.


Em que pese tudo isso, diante das informações amplamente veiculadas pela imprensa e redes sociais que dão conta de ações truculentas da PM do MA desrespeitando etnias e territórios, sem querer emitir julgamentos apressados e não plenamente objetivos, em nome da minha consciência ética e cristã, não devo e não posso aceitar o referido Prêmio de Direitos Humanos que, nesse contexto, parece-me contradizer o seu verdadeiro escopo.


Tenho conhecimento das dificuldades e dos esforços dessa excelente Secretaria na promoção e defesa dos Direitos Humanos. Por isso, longe de mim a intenção de responsabilizá-la pelas repetidas arbitrariedades no território Acroá-Gamella. Outras instituições governamentais e empresariais têm culpa no cartório. Quanto a mim, só me cabe afirmar que não é possível uma Secretaria promover e defender os Direitos Humanos no varejo enquanto outras Secretarias do mesmo Governo persistem em violentá-los.

Enfim, mesmo reiterando meu apreço e gratidão, aproveito este ensejo para aderir à nota de denúncia sobescrita por várias entidades.


Pe. Marco Passerini


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NOTA DE DENÚNCIA


As entidades abaixo subscritas vêm a público denunciar a prisão arbitrária de cerca de 20 indígenas do povo Akroá-Gamella, em Viana, Maranhão. Dentre os indígenas, está o agente da Comissão Pastoral da Terra (CPT-MA), Kum’Tum Akroa Gamella. De acordo com informações que chegam do território, a situação se iniciou na manhã de hoje, 18/11, devido à tentativa de instalação de linhões de energia elétrica da Empresa Equatorial Energia no território indígena sem a devida consulta prévia ou autorização dos Akroá-Gamella, que tentaram a via da negociação e foram totalmente ignorados pela referida empresa.


Além da prisão realizada pela Polícia Militar do Maranhão, foram recolhidos celulares e câmeras fotográficas que registravam a presença ilegal de equipes para instalação dos linhões. O ambiente é de tensão, devido à presença de jagunços armados contratados pela concessionaria de energia na região.


A situação é de extrema violência, por parte de jagunços e da Polícia Militar, com casas invadidas e tiros disparados.


Exigimos liberdade imediata aos indígenas presos, a apuração rigorosa das ações arbitrárias de instituições do Estado do Maranhão, assim como da empresa Equatorial contra os Akroa-Gamella.

Cáritas Brasileira Regional Maranhão

Conselho Pastoral dos Pescadores-MA

Comissão Pastoral da Terra-MA

Comissão Pastoral da Terra Nacional

Conselho Indigenista Missionário-MA

Sociedade Maranhense de Direitos Humanos

Agência Tambor

Fórum Popular de Educação do Campo do Maranhão

Rede de Agroecologia do Maranhão

Laboratório de Estudos Vulnerabilidades e Processos de Subjetivação/UFMA

Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros- NEAB/UFMA

Coordenação do Curso de Ciências Sociais da UFMA

Geiima – Grupo de Estudos Indígenas e Indigenistas no Maranhão/UFMA

APRUMA Seção Sindical do Andes Sindicato Nacional

Movimento de Defesa da Ilha

Grupo de Estudos Desenvolvimento, Modernidade e Meio Ambiente – GEDMMA/UFMA

Movimento dos Atingidos pela Base Espacial de Alcântara (MABE)

Associação Comunitária de Educação em Saúde e Agricultura- Acesa

Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Sem Terra MST

TIJUPÁ

NURUNI/UFMA

ANAÍ

União de moradores do Taim

Rede de mulheres das Águas e das Marés e dos Manguezais do Maranhão e do Piaui (Remumama)

Conselho Gestor da Resex Tauá-Mirim

Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Judiciário Federal e MPU no Maranhão – SINTRAJUFE/MA

Federação dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Estado do Maranhão – FETAEMA

Núcleo de Estudos e Pesquisas em Questões Agrárias – NERA/UFMA

Diretório Municipal do PSOL de São Luís

Núcleo de Etnologia e Imagem/UFMA

Gepolis – Grupo de Estudos de Política, Lutas Sociais e Ideologia/UFMA

Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco (MIQCB)

Comissão de Direitos Humanos da OAB/MA

Associação dos Produtores e Produtoras Rurais Quilombolas de Santa Rosa dos Pretos – Itapecuru-Mirim/MA

União das Comunidades Negras Rurais Quilombolas – UNICQUITA – Itapecuru-Mirim/MA

Grupo de Trabalho Fronteiras, Regionalização e Globalização na América, do Conselho Latino-americano de Ciências Sociais – CLACSO

Povo Anapuru Muypurá do Maranhão

Povo Tremembé da Raposa/MA

Povo Kariú Kariri – Comunidade Areial – Estreito/MA

Sinasefe Seção Maracanã

Movimento Quilombola de Bequimão/MA – MOQBEQ

CSP Conlutas

Ong Arte-Mojó

Observatório dos Conflitos do Extremo Sul do Brasil, da Universidade Federal do Rio Grande – FURG

FLUTUA/UFMA

Pastoral da Juventude – PJ/MA

Movimento Hip Hop Quilombo Urbano

Movimento Nacional Quilombo Raça e Classe

Movimento Mulheres em Luta

Juventude do Rebeldia

Batalha da LB

Coletivo ursula

PSTU

Justiça nos Trilhos JnT

São Luís, 18 de novembro de 2021.


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